*por Amaral Palevi Gómes Arévalo
Neste mês de junho, igual que em outros tanto países, celebra-se em El Salvador neste próximo 28 de junho O PRIDEsv 2014 “Eu construo equidade”; por tal razão vou dedicar a presente analise à questão queer em El Salvador. “Deixemos por um momento o problema da homossexualidade”, com estas palavras pode-se resumir o tratamento institucional, cultural, econômico, político, artístico da população queer em El Salvador. Por uma parte, nota-se que o queer existe, mas não é um tema de relevância para ser tratado; por outra parte o queer é visto negativamente ao ser considerado como um “problema” e não como um fenómeno social, contendendo o viés de enfermidade impresso desde o século XIX nessa expressão da sexualidade humana; convertendo-a em um “regime de verdade” que circula na maior parte dos discursos ao abordar tal condição nos espaços públicos e privados. O queer, no cotidiano de El Salvador, compreende-se como corpos abjetos materialmente e não-sujeitos no plano simbólico, expostos a dispositivos de controle e policiamento que interditam, censuram e negam o homossexual, o lésbico, o bissexual, o trans, e em suma geral todo o queer; excluindo-nos, marginalizando-nos, discriminando-nos, torturando-nos e assinando-nos. Esta situação não surgiu espontaneamente, mas sim como um processo historicamente construído, socialmente aceitado, culturalmente invisível, politicamente promovido, educativamente silenciado, cientificamente permitido e moralmente escondido. Conhecendo a existência do queer, do trans e da homossexualidade em El Salvador, posso afirmar que estas não são reconhecidas pelas instâncias de poder. O status quo sexual em El Salvador promove o heterosexismo como o fundamento da diferencia sexual e os essencialíssimos sexuais: os homens são construídos sob uma forte tendência e grande valorização da atividade genital e as mulheres em um desconhecimento do sexual. Nesse duplo posicionamento transita, esconde-se e manifesta-se o queer. A educação sexual em El Salvador encontra-se entre os silêncios que perpetuam falsas verdades. Tem existido um amplo movimento desde os anos 1990 para gerar mudanças na Educação sobre temas da sexualidade. Mas as vozes conservadoras, sendo a Igreja Católica a principal, têm impedido a implementação de programas educativos neste âmbito da vida salvadorenha, sob a escusa de que se estaria promovendo a libertinagem e a promiscuidade por meio deste tipo de ações educativas. As escolas não introduzem ditos conteúdos. Neste sentido, tornam-se inexistentes os conteúdos que abordam a orientação sexual e a identidade de gênero; no caso do queer, convertendo-o em algo invisível por meio das discriminações. A população queer, ao não ser reconhecida como composta por sujeitos existenciais, tem limitadas suas capacidades de desenvolvimento humano, as quais estão condicionadas ao acesso de bens culturais, simbólicos e econômicos; como educação, saúde e moradia; o que traz como resultado a negação de direitos humanos: seja porque não se pode optar por uma moradia básica, seja por que a educação é um espaço hostil devido a sua orientação sexual e sua identidade de género. Os Direitos Individuais da população queer negam-se por meio da invisibilidade destes nas leis; mas tal prática torna-se inútil nos Direitos Sociais, que em vez de continuar a trilha de invisibilizar direitos, desejam proibi-los legalmente. Assim tem sido com o processo de reforma constitucional em curso no país para incluir uma emenda que negue explicitamente a possibilidade da união civil entre personas do mesmo sexo. Essa reforma inicia no ano de 2003 com uma primeira ratificação que nega as uniões entre as pessoas do mesmo sexo, sendo necessárias duas ratificações em distintos períodos legislativos. No ano 2006 as votações dessa reforma cnstitucional foram arquivadas; mas em 2009 foram colocadas novamente na agenda legislativa dos partidos políticos conservadores. Seus promotores esperavam provavelmente que sua aprovação fosse um procedimento de trâmite legislativo, mas aconteceu exatamente ao contrário. A população queer ao ser consciente que a reforma constitucional não radicava somente na proibição de estabelecer uma família homoparental, senão que legalizaria a invisibilidade dos direitos individuais e o começo da proibição legal dos direitos sociais. Ante esta possibilidade surgiu a Aliança para a Diversidade Sexual, unificando as diferentes organizações LGBT, de prevenção do HIV e de ativistas independentes e que funcionou como um contrapeso para debater, confrontar, expor e propor ante a Assembleia Legislativa e a sociedade em geral uma alternativa àquela reforma constitucional. A Aliança logrou deter a reforma nesse período legislativo, mas ela ainda encontra-se nos arquivos da Assembleia Legislativa, aguardando o momento oportuno para sair. Isso poderia acontecer, por exemplo, quando da a aprovação da Lei da Água, convertendo o arquivamento da Reforma que legisla sobre a união das pessoas do mesmo sexo em uma moeda de troca com os partidos políticos conservadores. Em El Salvador é necessário pensar em políticas de Estado, e não só em programas paliativos que em pouco ou nada geram mudanças significativas na vida das pessoas queer. Para tal caso, e fazendo uso da comparação com o Brasil, trago à lembrança, os Programas Nacionais de Direitos Humanos de 1996 e 2002 como casos de política pública que fornecem diretrizes para orientara produção de novas leis e programas governamentais que beneficiem a população queer, ao invés de confirmar sua invisibilidade. Avaliando pessoalmente o caso de El Salvador, e inspirado pelos citados programas brasileiros, julgaria necessárias e urgentes a aplicação das seguintes diretrizes:
- Propor emenda à Constituição para incluir a garantia do direito à livre orientação sexual e a proibição da discriminação por orientação sexual.
- Apoiar a regulamentação da união civil entre personas do mesmo sexo e a regulamentação da lei de redesignação de sexo e mudança de registro civil para transexuais.
- Propor o aperfeiçoamento da legislação penal no que se refere à discriminação e à violência motivada por orientação sexual.
- Incluir nos censos demográficos e pesquisas oficiais dados relativos à orientação sexual.
- Promover a coleta e a divulgação de informações estatísticas sobre a situação sócio-demográfica dos LGBTI.
- Apoiar programas de capacitação de profissionais de educação, policiais, juízes e operadores do direto em geral para promover a compreensão e a consciência ética sobre as diferenças individuais e a eliminação dos estereótipos depreciativos com relação aos LGBTI.
- Inserir, nos programas de formação de agentes de segurança pública e operadores do direito, o tema da livre orientação sexual.
- Apoiar a criação de instâncias especializadas de atendimento a casos de discriminação e violência contra dos LGBTI no poder Judiciário, no Ministério Público e no sistema de segurança pública.
- Estimular a formulação, implementação e avaliação de políticas públicas para a promoção social e econômica da comunidade LGBTI.
- Incentivar ações que contribuam para a preservação da memória e fomento à produção cultural da comunidade LGBTI.
- Incentivar programas de orientação familiar e escolar para a resolução de conflitos relacionados à livre orientação sexual, como objetivo de prevenir atitudes hostis e violentas.
- – Promover a sensibilização dos profissionais de comunicação para a questão dos direitos humanos dos LGBTI.
*Amaral Palevi Gómez Arevalo é Docente de Ensino Superior, Doutor em Estudos Internacionais em Paz, Coonflitos e Desenvolvimento (Universitat Jaume I), Graduado em Ciências da Educação (Universidad de El Salvador). Gestor de projetos de desenvolvimento comunitário com jovens, homens e atenção à população LGBT. Promotor de cultura de paz, a partir de meios audiovisuais